Aparentemente os filmes da chamada "Última Chance" do Festival do Rio são aqueles que as distribuidoras não querem o negativo de volta, hahahaha... Brincadeiras a parte, é fato que até o momento estes filmes não são os mais populares que restaram. O Pecado de Hadewijch (Hadewijch, 2009) produção francesa dirigida e roteirizada por Bruno Dumont é um bom exemplo disso.
Assistindo a filmes premiados como esse eu começo a questionar meu próprio senso crítico. Será que é só comigo quando um personagem leva mais de 10 segundos em uma cena sem diálogo ou trilha sonora para fazer alguma coisa eu começo a sentir sono. Talvez esses filmes simplesmente não sejam pra mim.
Enfim, mas Hadewijch não é de todo mal, pelo contrário. De fato, as coisas melhoram bastante conforme o drama se mistura com um princípio de ativismo político e uma crítica social que se fosse mais bem construída seria muito melhor. E não me daria tanto sono, a propósito.
A trama conta a história da francesinha Celine (Julie Sokolowski) católica extremamente religiosa e filha de um poderoso tecnocrata do governo, mora em um convento onde busca ficar mais perto de Deus.
Contudo ela sente em seu íntimo e especialmente com a chegada da puberdade que precisa se devotar ainda mais para conhcer o verdadeiro amor em Cristo, contudo ela exagera no trato, deixa de comer e por aparentar mais dor do que encontrar um refúgio na fé, acaba expulsa do convento e é recomendada a se relacionar com outras pessoas e encontrar um ponto de equilíbrio.
É quando encontra Yassine (Yassine Salime), um jovem rebelde e muçulmano completo oposto de Celine. Os dois se relacionam de forma bem tumultuada: Celine declara que não quer contato físico com homens e que quer se manter pura para Cristo, Yassine parece frustrado, mas aos poucos vai entendendo o posicionamento da garota, embora não concorde nada.
É através de seu relacionamento com Yassine que ela conhece Nassir (Karl Sarafidis) um pregador na mesquita local que usa o extremo de seu fervor religioso ao ponto do fanatismo e que acredita que a morte por uma causa é a maior oferenda que um homem pode dar a Deus. A soma destes dois aparentes contra-pontos poderá ter graves consequências.
Hadewijch mexe com muitos assuntos ao mesmo tempo e por isso fica um pouco confuso e desfocado, mas uma é constante: Alienação religiosa, e não somente do islamismo e do cristianismo (que são duas das maiores religiões terrestres), mas de qualquer extremo, até daqueles que não tem nenhuma crença. A crítica é evidente e contundente, afiada para causar reflexões sobre como a cabeça de algumas pessoas são influenciadas de tal maneira que são capazes de qualquer coisa, menos conviver com as diferenças e se flagelar acreditando que estão fazendo o bem, quando aos olhos da maioria é um absurdo.
Dumont ganha alguns pontos por isso, não procura se colocar nem contra ou a favor de qualquer religião (ou da ausência dela, repito), e embora tenha pegado um pouco mais pesado com os estereótipos muçulmanos, orna factível (se não compreensível) o por que de atitudes tão irracionais que são condenáveis sobre todas as óticas civilizadas. Contudo o excesso de situações alheias para se chegar nesse desfecho e muitas cenas intermináveis (uma em particular com uns sanfoneiros rockeiros de doer os ouvidos) torna o filme cansativo.
Até chegar nos "finalmentes", tem uma pontinha de drama, romance, relacionamento familiar, etc. Tudo bem que faz parte do desenvolvimento do personagem, contudo lá pelas tantas as coisas se aceleram de tal forma (para fechar o tempo, creio eu) que acaba ficando confuso e cheio de pontas desamarradas.
Só que é aquilo que eu disse, é um "filme de festival" e ganhou o prêmio da crítica internacional do Festival de Toronto de 2009 e tem grande valor enquanto filme de arte. Fotografia esplêndida, a atuação de Julie Sokolowski estonteante (os demais nem tanto), direção na medida certa para corresponder a proposta. Tinha tudo pra levar alguns prêmios mesmo.
Cheio de mensagens explicitas e muitos simbolismos (incluindo um final aberto que parece um comercial da CVV), O Pecado de Hadewijch não é brilhante o suficiente para fazer você chorar, mas ao ser instigante o suficiente para provocar reflexões ao sair da sala de cinema é uma boa alternativa.

Trailer: